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Bahia tem uma morte por queimadura a cada 10 dias; estado não tem banco de pele

Há dois anos, Adriana Pereira Borges, 26 anos, ouviu uma voz desconhecida chamá-la pelo nome na frente de casa. Se soubesse que estava prestes a colocar as vidas dela e do seu filho mais novo, então com três meses, em risco, não abriria a porta. “Foi a amante de meu marido. Ela chegou chamando meu nome na porta de casa, eu abri e estava com meu bebê no colo. Na mesma hora, fui surpreendida com ácido e só deu tempo de proteger meu filho. Graças a Deus, ele não teve nada”, contou Adriana, que teve todo o lado esquerdo do corpo atingido pela substância corrosiva e quase perdeu a visão de um dos olhos. Até aqui, foram 19 cirurgias feitas no Hospital Geral do Estado (HGE), mas ainda faltam muitas outras para apagar ou, pelo menos, amenizar as marcas do ataque.
Apesar das cicatrizes, Adriana escapou de entrar para uma estatística muito mais triste: a de mortes ocasionadas por queimaduras na Bahia. Em média, o estado registra uma vítima fatal a cada 10 dias – foram 36 mortes em um ano. Os números, porém, demonstraram queda de 20% no acumulado de 12 meses, a partir de junho do ano passado.
Esses dados ajudam a colocar o Nordeste, junto com o Sudeste, como as regiões com mais vítimas de queimadura do país. Juntas, elas concentraram 63,4% dos registros, entre outubro de 2017 e março de 2018. Os dados são do DataSus, o banco de dados do Ministério da Saúde.
Os registros da plataforma mostram também que a Bahia somou 679 mortes por queimaduras ou corrosões neste segundo período, o que leva a uma taxa de mortalidade de 3,51% no estado, a 5ª maior do país.
Entre 2015 e 2018, a Bahia, que não conta com um banco de pele (ver ao lado), somou 6.233 internações por queimaduras e corrosões; só na capital foram 3.050 ocorrências neste período, incluindo o caso de Adriana, que anteontem participou, como voluntária, do II Fórum de Tratamento de Queimaduras e Feridas Complexas – Novas Tecnologias para o Cuidado, que aconteceu na Faculdade de Medicina da Ufba, no Terreiro de Jesus.
Autoestima
Ela falou sobre a luta diária que trava para tentar recuperar a autoestima, diante das marcas deixadas pelo ataque com ácido. “Me emocionei porque, desde o acidente, eu não tive coragem de ver como está meu rosto e hoje eu pude ver, só que de uma forma bem diferente”, comentou a jovem, que é mãe de mais duas crianças e acabou perdoando o marido – ele jurou não conhecer a agressora, que ficou detida apenas dois dias e está em liberdade.
A enfermeira estomaterapeuta e coordenadora do Centro de Queimados do HGE, Moelisa Queiroz dos Santos Dantas, destaca a importância do cuidado psicológico com os pacientes queimados, em especial as mulheres. Uma das ações do HGE e da Sociedade de Cirurgia Plástica Bahia (SBCP-BA) é incentivar a adoção de maquiagem para mulheres que ficaram com cicatrizes.
“Não estamos falando de um aspecto estético. A autoimagem feminina fica muito comprometida com a queimadura, principalmente quando acomete a face, e as cicatrizes podem impactar nas relações sociais, que envolvem relacionamentos afetivos e até mesmo no trabalho”, comenta ela.

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